A Câmara de São Mateus recorrerá de liminar concedida em ação judicial movida pela Prefeitura de São Mateus, que determina a devolução de quase R$ 600 mil economizados pelo Legislativo aos cofres públicos municipais. O anúncio foi feito pelo presidente Jorginho Cabeção, em entrevista coletiva à imprensa, na manhã desta quinta-feira (4/06), acompanhado dos outros vereadores membros da Mesa Diretora: Carlos Alberto Gomes Alves (vice-presidente) e Jozail do Bombeiro (1º secretário). Também participaram os procuradores Gilson Guilherme Correia e Marcelo Pichara Mageste Sily.

A decisão é da juíza de Direito Thaita Campos Trevizan, da 2ª Vara Cível (Fazenda Pública) da Comarca de São Mateus-ES, e causou estranheza no meio jurídico em São Mateus, porque foi fundamentada na Lei Orgânica Municipal, sem levar em conta uma emenda feita na legislação em 2017. Além disso, a magistrada não considerou decisão colegiada do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCES) contrária ao pedido da Prefeitura de São Mateus, nem parecer do Ministério Público Estadual acompanhando o entendimento do TCES.

Proferida na terça-feira (2/06), a decisão judicial no Processo nº 0004875-09.2019.8.08.0047. que tramita desde agosto de 2019, foi amplamente anunciada pelo Executivo Municipal, utilizando a estrutura oficial de Comunicação Social junto com a rede de páginas Boca no Trombone, comprovadamente produtora e distribuidora de fake news (notícias falsas), que assessora o prefeito Daniel Santana e divulga os atos da gestão municipal na internet e nas redes sociais.

A magistrada determinou que a Câmara de Vereadores devolva, em conta judicial, os valores decorrentes de título de duodécimo não utilizados pelo Legislativo nos exercícios financeiros dos anos de 2017 e 2018, que chegam ao montante de R$ 593.506,80. Foi feita a advertência de que a decisão seja cumprida em 10 dias, “sob pena de medidas mais duras que possibilitem o resultado prático equivalente”.

Na coletiva desta quinta-feira (4/06), o presidente da Câmara Municipal, Jorginho Cabeção, explicou que a juíza Thaita Campos Trevizan embasou sua decisão no Inciso V do Artigo 30 da Lei Orgânica do Município de São Mateus, que já foi extinto. Anteriormente tinha a seguinte redação: “À Mesa [Diretora], dentre outras atribuições, compete: “devolver à tesouraria da Prefeitura o saldo de caixa existente na Câmara, ao final do exercício financeiro”.

No entanto, conforme o presidente esclareceu, a Câmara de São Mateus aprovou, em 30 de novembro de 2017, a Emenda à Lei Orgânica Municipal nº 041, alterando o referido Inviso V do Artigo 30, que passou a ter a seguinte redação: “À Mesa [Diretora], dentre outras atribuições, compete: ‘devolver à tesouraria da Prefeitura a qualquer tempo o saldo de caixa existente na Câmara'”.

Na Decisão nº 03372/2019-1 do Processo 16684/2019, do Tribunal de Contas do Espírito Santo, o parecer do conselheiro relator Luiz Carlos Ciciliotti da Cunha destacou que “o dispositivo acima transcrito está muito mais criando uma regra de competência para a Mesa da Câmara dos Vereadores do que obrigado a devolução”, fazendo referência ao Parecer Consulta 04/2017.

“É o que observo dessa primeira análise, que é perfunctória, já que atinente aos pressupostos cautelares. Assim, não verifico presença do fumus boni iuris [sinal de bom direito] a fundamentar uma determinação cautelar, considerando que, além do dispositivo não parecer criar a obrigatoriedade de devolução, nem ao menos fixa um prazo, já que se utiliza da expressão ‘a qualquer tempo’. Não havendo fumus boni iuris [sinal de bom direito], não há que se inquirir a presença de eventual periculum in mora [perigo da demora]”, enfatizou o parecer, aprovado por unanimidade em sessão colegiada da Primeira Câmara do TCES em 20 de novembro de 2019.

DECISÃO NO EMBALO DA PANDEMIA

Depois de nove meses de tramitação, a Procuradoria Geral do Município reforçou os argumentos ao Juízo da 2ª Vara Cível no embalo do enfrentamento à pandemia da covid-19, valendo-se que o Município de São Mateus, conforme decreto municipal, encontra-se em situação de calamidade pública até dezembro de 2020.

“Entendo, inclusive, que a gestão dos referidos valores pelo Executivo, cuja atividade fim é aplicar o dinheiro público de acordo com a necessidade e o interesse público, poderia ser muito bem utilizado, a título de exemplo, no combate ao Covid-19, sendo comum em tempos de pandemia, conforme divulgado amplamente pela Imprensa, pedidos de devolução antecipada de duodécimos por parte das prefeituras, a fim de aplicar tais valores em combate à pandemia que nos assola, sem discutir ou não nesta seara a obrigatoriedade de devolução antecipada”, afirmou a juíza Thaita Campos Trevizan, na decisão cautelar.

O presidente da Câmara de São Mateus e os demais integrantes da Mesa Diretora destacam que não havia necessidade de o prefeito Daniel Santana criar um mal-estar e acirrar os ânimos entre os poderes Executivo e Legislativo, porque a Câmara de Vereadores já havia sinalizado a devolução de R$ 600 mil para serem utilizados nas ações de enfrentamento ao novo coronavírus.

“Já houve repasse da primeira parcela de R$ 200 mil, utilizada na aquisição de cestas básicas doadas a famílias carentes”, frisou Jorginho Cabeção. Além disso, ele acrescenta que, de 2017 até agora, o Legislativo já devolveu aos cofres municipais mais de R$ 600 mil, quantia superior ao valor que o prefeito Daniel reivindica na Justiça, que é de R$ 593.506,80.

CESTAS BÁSICAS SEM PRESTAÇÃO DE CONTAS

O CENSURA ZERO apurou que a Prefeitura de São Mateus já movimentou recursos para a aquisição de cerca de 30 mil cestas básicas, incluindo a distribuição normal feita pela Secretaria Municipal de Assistência Social e os alimentos para entrega emergencial.

No entanto, o prefeito Daniel Santana ainda não disponibilizou no Portal da Transparência da PMSM a prestação de contas dos recursos e das famílias atendidas. Vale ressaltar que o CENSURA ZERO já publicou diversas reportagens com relatos detalhados de famílias compostas por idosos, deficientes físicos, crianças, adolescentes e desempregados que estão tendo o cadastro negado por conta dos critérios definidos pela Prefeitura de São Mateus. Relatam que não passam fome neste momento de pandemia da covid-19, porque estão contando com a solidariedade de familiares e amigos.

Sobre essas denúncias, ainda não houve manifestação oficial da Prefeitura de São Mateus, da Secretaria Municipal de Assistência Social, da Câmara Municipal nem do Ministério Público Estadual. No entanto, o MPES, por meio da 2ª Promotoria de Justiça Cível de São Mateus, tem agido no combate à negligência do prefeito Daniel Santana na fiscalização ao cumprimento de decretos municipais para que seja assegurada a eficácia das medidas no combate à covid-19.

As notas recomendatórias e premonitórias têm evidenciado parcela alta de responsabilidade da gestão municipal no aumento crescente de infectados em São Mateus. O município lidera o número de casos do novo coronavírus no centro-norte capixaba e é o terceiro em contaminação fora da Grande Vitória.

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