ARTIGO – As meias verdades da Reforma Tributária

POR FRANCISCO GOMES JUNIOR*

Saudemos a Reforma Tributária! Depois de gestada e discutida por décadas, uma reforma constitucional que é o passo inicial para a substituição de um complexo sistema tributário nacional, confuso, ineficiente, um emaranhado com milhares de normas, instruções, resoluções, uma colcha de retalhos. 

Mas a aberração do sistema tributário em substituição não se criou sozinha. Não é um ser que se desenvolve por inércia ou alguma força da natureza. É resultado da criação legislativa e infra legal de nossos legisladores, reguladores e fiscalizadores, que produziram um emaranhado legal e os consequentes especialistas, únicos capazes de analisar, interpretar e até encontrar brechas legais nesse caos. 

Agora, o primeiro argumento a favor da Reforma Tributária é o da simplificação. A racionalidade de eliminar milhares de normas e iniciar-se um sistema similar ao adotado em várias partes do mundo, sobretudo por países da OCDE, que o Brasil quer fazer parte.

Mas da mesma forma como a aberração em que se transformou o “antigo” sistema tributário foi obra dos homens da lei, o novo sistema está sendo construído por eles. É uma leitura acurada do texto da reforma, nos leva a conclusões preocupantes para o que poderemos ter a médio prazo.

A reforma constitucional é principiológica e não prevê aspectos operacionais, o que é correto. Para tais aspectos, em vários momentos o texto aprovado aponta para a necessidade da criação de legislação complementar. 

Assim, por exemplo, estabelece-se que os Municípios e o Distrito Federal poderão criar leis para o custeio de serviços de iluminação pública, sistemas de segurança e preservação de logradouros públicos. O Brasil possui mais de 5.500 Municípios, se somente 20% deles se valer dessa faculdade, teremos mais de 1.000 leis somente em relação a este tema. 

E nessa toada segue o texto da reforma tributária, prevendo legislação complementar para imposto sobre bens e serviços de competência compartilhada entre Estados, Distrito Federal e Municípios; prevendo que cada Estado fixará alíquota própria para seus impostos e prevendo inclusive que resoluções do Senado Federal fixarão alíquotas de referência para cada esfera federativa, se outra não houver sido estabelecida pelo próprio ente federativo. 

Ao longo do texto temos a menção de praticamente uma centena de legislações complementares que serão obrigatoriamente produzidas. Tais legislações, multiplicadas pelos números de Estados e de Municípios nos levarão novamente a milhares de normas, a um novo emaranhado tributário nacional. O emprego dos especialistas está mais do que garantido. 

Portanto, e esse artigo restringe-se a esse ponto de simplificação de um novo sistema tributário nacional, trata-se de uma meia verdade. Na realidade temos a estimativa de que milhares de normas complementares serão produzidas, mas com uma variável: a depender da vontade de nossos legisladores esse número poderá ser ainda maior. E a sanha legislativa minuciosa tem sido uma constante no país. 

Como neste ponto, é necessária uma leitura acurada do texto aprovado da reforma tributária, antes de chegarmos a conclusões apressadas que a médio prazo podem se mostrar equivocadas. 

Que a reforma era necessária, não resta dúvidas. Mas, podemos torná-la ineficaz ou uma nova colcha de retalhos é uma possibilidade. 

*FRANCISCO GOMES JÚNIOR é Advogado Especialista em Direito Digital, Presidente da Associação de Defesa de Dados Pessoais e do Consumidor (ADDP). www.ogfadvogados.com.br

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