O Ministério Público Eleitoral constatou “verdadeira fraude à cota de gênero”, manifestando-se pela anulação dos votos da chapa de vereadores do PP nas Eleições 2024 em ação de investigação eleitoral em São Mateus, impetrada pela federação PSDB-Cidadania. Mas a juíza eleitoral Fábia Médice de Medeiros julgou “improcedente” o pedido formulado, afastando a possibilidade de cassação dos mandatos de Cristiano Balanga e Isael Aguilar, reeleitos para a Câmara Municipal pelo Progressistas. A parte autora da ação já prepara recurso ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE).

A Federação PSDB-Cidadania alega que as candidaturas de Nyana Policarpo Farina, a Cabo Farina, e de Laudineia Santos Ramos, a Neia Ramos, foram registradas pelo PP apenas para cumprir o percentual mínimo de candidaturas femininas exigido pela legislação eleitoral, sem a real intenção de concorrer ao pleito. E apontou a ausência de atos de campanha registrados ou amplamente divulgados, prestações de contas com movimentação financeira padronizada e votações inexpressivas, com custo por voto até 80 vezes maior se comparado a outros candidatos. Neia teria gastado R$ 15.796,00 para obter 9 votos; e Cabo Farina, que prestou contas de R$ 22.102,98, obteve 13 votos.

No parecer do MPE, a promotora eleitoral Blandina Irene Junqueira Gutmann, foi categórica ao afirmar que as provas juntadas ao processo e os depoimentos das candidatas suspeitas Nyhana Farina [Cabo Farina] e Laudineia Ramos [Neia Ramos] “demonstram, de forma convergência e inequívoca, que as candidaturas foram lançadas com finalidade meramente formal, sem qualquer intenção real de disputa eleitoral, configurando verdadeira fraude à cota de gênero”.

Em sustentação a esse aspecto, a promotora eleitoral destaca que “a cláusula de gênero não
pode ser preenchida com candidaturas fictícias, de última hora, sob pena de se frustrar a vontade do legislador e esvaziar a política afirmativa de maior participação feminina nas eleições”.

A representante do Ministério Público frisa que os fatos e as provas da ação de investigação eleitoral comprovam “que as candidatas tiveram dificuldade, inclusive, em indicar os seus respectivos números de candidatura, bem como não realizaram nenhum tipo de campanha, propaganda ou tentativa de angariação de votos”.

“Diante do conjunto fático-probatório apresentado e produzido, resta demonstrada a ofensa à legislação eleitoral quanto à reserva de gênero”, assinala a promotora Blandina Gutmann no parecer do MP Eleitoral, reforçando que as candidaturas de Cabo Farina e Neia Ramos “se deram com o único objetivo de preenchimento da cota de gênero nos termos do Artigo 10 parágrafo 3º da Lei 9.504/97”.

Sentença

Em sentença proferida nessa sexta-feira (16/05), a juíza eleitoral Fábia Médice de Medeiros rechaçou o parecer do Ministério Público Eleitoral e julgou “improcedente” a ação movida contra a chapa de candidatos(as) a vereadores(as) do Progressistas (PP).

A magistrada argumentou que “a fraude à cota de gênero, por constituir acusação grave com potencial de anular a vontade popular expressa nas urnas, exige prova robusta e incontestável, não podendo ser presumida a partir de circunstâncias equívocas ou de interpretação duvidosa”.

Conforme noticiou o CENSURA ZERO, nas oitivas, houve a comprovação de que as duas candidaturas femininas suspeitas foram fomentadas por outros membros do partido e os gastos de campanha destoaram das atividades que teriam sido realizadas nas Eleições 2024. O também candidato a vereador pelo PP Francisco Amaro confirmou que os demais membros da chapa se juntaram para pagar um valor mensal a Neia Ramos, que precisou deixar o trabalho para se candidatar e ficou sem renda. No entanto, a juíza Fábia Médice afirmou, na sentença, que “não há nos autos elementos aptos a comprovar as alegações [da parte representante, corroborada pelo Ministério Público Eleitoral]”.

“(…) O custo por voto não constitui elemento caracterizador de possível fraude. Os elementos dos autos demonstram que houve real intenção de participar do pleito, afastando a caracterização da fraude alegada”, finalizou a magistrada.

Recurso

Procurada pelo CENSURA ZERO, a defesa da Federação PSDB-Cidadania afirmou que recorrerá a decisão de primeira instância ao Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo (TRE-ES).

“Já estamos preparando o recurso”, frisou o advogado Allan Furieri à Reportagem.

Para entender:

Em São Mateus, uma chapa completa para a Câmara de Vereadores é composta de 12 candidatos (11, que é o número de vagas no Legislativo + 1), sendo oito homens e quatro mulheres, ou vice-versa. A falta de um candidato do gênero minoritário incorre na retirada de dois do gênero com mais nomes apresentados. Por isso, os partidos se movimentam para que não ocorram desfalques.

A votação por partidos em São Mateus foi a seguinte: PP – 9.379 (2 eleitos); União Brasil – 6.295 (1 eleito); Podemos – 6.265 (1 eleito); PSB – 6.241 (2 eleitos); PSD – 4.958 (1 eleito) ; MDB – 4.794 (1 eleito); PT – 4.048 (1 eleito); PL – 3.892 (1 eleito); PDT – 3.212 (1 eleito); Republicanos – 2.959; Novo – 2.329; PSDB – 2.039; Rede – 1.608; DC – 1.213; PRD – 837; PMB – 776; AGIR – 716; PV – 530; PC do B – 510; PRTB – 407; Cidadania – 374; Avante – 225; Solidariedade – 193. Em São Mateus, foram 64.664 votos válidos para a Câmara de Vereadores, com o registro de 1.755 votos em branco e 1.289 votos nulos.

No caso de anulação de votos do PP e a cassação dos mandatos dos atuais vereadores Balanga e Isael, as vagas seriam preenchidas por Paulo Fundão (União Brasil) e Pastor Marques (Podemos).

O OUTRO LADO

O CENSURA ZERO disponibiliza espaço, a qualquer momento, a possíveis argumentações de envolvidos na ação de que trata a reportagem.

Havendo retorno, o texto será atualizado.

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